Regresso com mais uma conversa literária, desta vez com um homem das artes. Actor, escritor, cantor e performer, lançou em 2019 o seu mais recente álbum O BEM. O MAL. A RAZÃO., já participou em novelas e apresentou os seus dois livros em palco. Falo-vos de Diogo Divagações que se assume como um performer, um sonhador, um autor. Maioritariamente um escritor de desejos e alguém que executa para concretizar vida.
Olá Diogo, e desde já obrigada por me concederes esta entrevista.
Grato pelo convite e pelo interesse Liliana.
Qual é a tua leitura atual?
Neste momento a minha leitura está a ser o meu livro. O próximo, digo. Estou a fazer revisão e a olhá-lo numa ótica de entendimento à edição. Uma vez que deste livro saem os textos que irão compor o meu próximo projeto musical…
Quando e como entrou a escrita na tua vida?
Recordo-me que foi aos 14 anos que me debrucei mais a sério. Coincidentemente foi também quando passei a fazer parte do primeiro grupo de música e então por esse motivo a necessidade de escrever sobressaiu. Isso e mais uns quantos problemas pessoais à data que não vale a pena referir. Mas sim, 14 anos foi o início com o hip-hop como ponto de partida e a rebeldia da altura como combustível.
Além de autor és também um performer, como concilias todas estas atividades?
Esta é uma pergunta para a qual não há uma resposta ‘certa’. Acho que, no meu caso, ambas são indissociáveis. Quando escrevo estou já a contemplar, regra geral, o dizer em voz alta, o interpretar os textos, portanto conciliar não é sequer uma questão que me tome tempo, é sim uma forma natural do que faço. Eu escrevo e digo as coisas que escrevo seja através da música ou em sessões de poesia dita, ou peças de palco. Ser performer é só uma via rápida para as coisas que gosto de fazer. Ultimamente o trabalho vem já como um ‘bolo’: há o texto, há as camadas sonoras, há o vídeo. Para palco há cenografia, há coreografia. Enfim, nada é estanque e independente né?
Apresentaste um livro através de uma peça em palco, como surgiu a ideia, e como foi a experiência?
Os dois livros tiveram esse tipo apresentação. Exatamente pela questão acima… o que escrevo tem sempre cenários naturalmente visuais, por esse motivo, e ligando à minha parte de performer foi natural o processo. Recordo-me que a apresentação do primeiro (2011 se não me engano) deveu-se ao facto de estar intimamente ligado a um grupo de amigos que todos eles tinham em si as valências que motivavam. A dança, a música, a noção de ator. Enfim. Depois é tudo dependente da quantidade de vontade que estamos dispostos a empenhar num objetivo. Ouvi de um amigo com quem cheguei a trabalhar a seguinte frase: primeiro trabalho com profissionais, se forem também amigos tanto melhor. E é tão somente isto que sinto, ideias surgem sempre e as pessoas ligam-se em função do querer e da intenção de futuro.
A experiência em si foi maravilhosa. Os resultados finais foram sublimes (sou super suspeito a falar disto – mas o público confirmou) e acima de tudo foi a constatação de que quando permites aos outros a visão do teu trabalho as coisas podem atingir uma dimensão bem maior do que a que contemplavas.
Escreveste diversos livros, que inclusive tens no teu site à disposição de qualquer leitor de forma gratuita. Existe alguma razão para que tal aconteça?
Esses livros que falas foram uma parceria com um artista de Santa Maria da Feira. Ele lançou o desafio de ilustrar esses textos e uma vez que tudo foi feito numa ótica de liberdade criativa achei por bem disponibiliza-los também de forma livre. Somente isso.
Escreves poesia, o que mais te atrai neste género?
Pergunta interessante esta. Atrai-me as vísceras e o desalento. Os planos de sonho. O horizonte que se cria há medida que para ele se avança. Sinto que a poesia permite uma das coisas que mais acho acerca da vida: não existem regras. É uma tela em branco que pode ser pintada com as cores que mais aprouverem.
Como consideras que é visto este género no panorama literário nacional?
Questões mais técnica e para as quais não tenho uma opinião solidificada. Honestamente não sei o que é o ‘panorama literário nacional’. Não sei mesmo. Acho porém que há espaço para tudo e a poesia ocupa o seu espaço em função de quem a ela se dá e de quem dela bebe. A poesia somos todos, e é tudo em si, sendo uma parte do todo que é o viver. Um rasgo de possibilidade no imenso espectro que é o manifestar a ocorrência existencial.
O próprio panorama literário em Portugal já viveu melhores dias, qual consideras ser o principal problema para que haja tanta dificuldade do mesmo a aceitar os novos autores?
As dificuldades no geral são as que impomos a nós mesmos. Isto é, está tudo ‘aí’, quem procura encontra (regra geral) e as coisas tendem a chegar a quem delas precisa. Portanto, para o caso dos leitores tem mais que ver com a comunicação ou a intenção do autor a fazer-se chegar a novos olhos e corações. O mundo é vasto e se a vontade é chegar a um público específico o trabalho de apresentação tem de contemplar essa ramificação.
Agora, se as coisas são feitas sem uma expectativa as possibilidades são infinitas. Já dei por mim a ser visto e lido por pessoas que nunca pensei interessarem-se pelas temáticas que abordo ou com a linguagem com que me expresso. Acho mais que a surpresa de deixar o mundo fazer-se sentir é mais benéfica do que planear que determinado grupo de seres credite o valor do que expresso e penso e sinto e deixo ao mesmo mundo…
Qual é a característica que é necessária para se conseguir ser escritor em Portugal?
Não faço ideia. Para isso teria de ser escritor na ascensão da palavra, e não acho que seja. Eu escrevo porque sim e porque de outra forma não sei bem como viver. Escrever é mais do que ser lido ou para ter um status. Escrever é e a escrever sou. Características não consigo apontar porque como disse acima não há regras e acho essa a maior maravilha.
Editaste um dos teus livros pela Chiado Editora e publicaste também de forma independente, que em pouco difere a não ser a possibilidade de colocar à venda as obras em grandes lojas online como a Wook, Bertrand, e outras do género. Qual consideras ser a maior vantagem e desvantagem destes métodos de publicação.
A chiado foi uma experiência à altura. Creio que na fase que estava queria muito que o livro chegasse longe e me desse um tal de status. Foi interessante porque o trabalho que teria a entrar em determinadas plataformas foi bastante mais facilitado. Contudo não creio que vá repetir o método. Ao longo do tempo tenho vindo a olhar para os projetos de uma forma mais integra e sempre houve em mim a vontade de entregar as coisas de forma mais sólida e menos dispersa.
Positivamente o alcance. Negativamente é exatamente a mesma questão: estava em todo o lado, assim como muitas outras, e acabou por ficar perdido no emaranhado do que é o ruído geral de coisas que são lançadas. Não sei se foi explicito mas é por aqui.
Vemos hoje em dia as redes sociais cada vez mais presentes no quotidiano, consideras que são relevantes para o teu trabalho enquanto autor?
As redes sociais são importantes sim. Agora, há mais vida para além delas. Aliás a vida é para além delas. São uteis sim, fazer delas o tudo é que já não é tanto assim. Considero importante porque descubro e sou descoberto mas ainda nada suplanta o contacto real com pessoas que se identificam e ainda se reúnem em prol de um sentir e querer.
Se tivesses a oportunidade de jantar com um escritor, qual escolherias? E que lhe perguntas lhe farias?
Bukowski, o tio! Encontrei-o quase à toa mas quando dei com ele senti que era muito eu ali. Não sei bem explicar. Que pergunta lhe faria? Não creio que fosse uma só pergunta. Acho que o convidava para um belo jantar, regado a vinho tinto e com uma sobremesa de whisky até que chegássemos ao estado de graça de despir a vida acompanhados pelo Baco.
Por fim, quais são os teus projetos para novos livros?
Estou agora, como disse na primeira pergunta, a rever o meu livro. Ainda não sei bem o que quero com ele ou como ele chegará a ser conhecido. Tem sido um parto difícil e nada aponta para que ele se apresente tão cedo. É das coisas mais elaboradas e exigentes que tenho vindo a fazer e não é um livro por si só. É um conjunto de cadernos com temáticas e ramificações de escrita variadíssima em sim. Acrescentando que há o ‘audiobook’ do mesmo. Um projeto demasiado grande para ser olhado com uma edição ‘normal’. Assim, o projeto é só um: sem nome de(coração) – o que fica do que passa.
Onde pode conhecer sobre o Diogo