A minha convidada de hoje tem vários livros publicados e recentemente reeditou o seu primeiro livro, só que em inglês pela Wrecking Ball Press, sendo ela própria a tradutora. Nesta conversa falaremos tanto dos seus livros como da sua escrita e experiência, convido-vos a conhecer melhor a Isabel Tallysha-Soares.
Olá Tallysha, agradeço-lhe a oportunidade de conversar consigo.
Qual foi a sua última leitura?
Olá Liliana, obrigada eu pelo convite e, por favor, é “tu”. Eu não tenho uma última leitura porque leio muitos livros ao mesmo tempo. Mas as mais recentes foram “Balada de Amor ao Vento” de Paulina Chiziane, “Contacto e Outras Crónicas” de José Craveirinha, “A Life on Our Planet” do David Attenborough e “New Jack” de Ted Conover.
Como entrou a escrita na tua vida? Sempre sonhaste ser escritora?
A escrita veio fácil. Sempre escrevi desde que comecei a pôr as letras juntas e, como académica, a minha vida tem uma grande componente de escrita. Na ficção comecei por publicar pela mão do Pedro Rolo Duarte textos do meu blogue na revista do Jornal i e depois veio a publicação de “Eu, do Nada”. Desde aí nunca mais parei.
Eu, do Nada foi o teu primeiro livro. Como surgiu a ideia para o enredo?
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A ideal, de facto, não é minha. O enredo é a história da minha família materna desde 1810. O que eu fiz foi dar uma camada de ficção à realidade e trocar as gerações pois nem nos nomes das personagens mexi. Só posso agradecer à minha família que me tenha dado tanto material para me inspirar.
A história passa-se em 1911. Quanto tempo de pesquisa alocaste a este livro?
1911 é a data do nascimento da personagem principal, que coincide também com a data de nascimento da minha Avó materna.
Como pesquisa usei albuns de fotos familiares, recortes de jornais, o acervo de livros e revistas dos meus avós e muita pesquisa de factos na internet e em documentos históricos. O livro foi escrito muito rapidamente pois era montar um enredo que eu conhecia. Depois foi o trabalho de fact-checking e correção histórica que tive de fazer para não cometer gafes. Por exemplo, quando escrevo sobre os republicanos catalães que se refugiaram em Barrancos na altura do Estado Novo e da Guerra Civil Espanhola isso teve bastante pesquisa assim como as cheias de 1967 e a batalha de La Lys na I Guerra Mundial.
Recentemente editaste novamente esta história, mas em inglês. Era algo que tinhas planeado?
O que motivou esta reedição? Como sei que é muito difícil as obras portuguesas terem penetração em mercados fora de Portugal, decidi fazer eu a tradução de “Eu, do Nada” (“I, from Nothing”) e procurar uma editora anglófona. Felizmente consegui. Os únicos requisitos que eu tinha eram fazer eu a tradução pois, como tradutora, estou dentro da cabeça da autora e a tradução literária é muito particular e o outro requisito era encontrar uma editora convencional pois não queria nem a auto-publicação nem uma editora “vanity”.
É apenas uma tradução, ou reescreveste algumas partes na história?
Toda a tradução tem alguma reescrita, sobretudo quando se trata de línguas de famílias diferentes. O inglês é germânico e o português é latino por isso a tradução literal é impossível. Além disso, houve necessidade de “anglicizar” a linguagem para não ficar uma tradução estranha a um leitor anglófono (que, infelizmente, é o que acontece a muitas traduções). Neste caso, para ajudar os leitores desenhou-se mapas de Portugal e do local da história e incluiu-se uma genealogia e uma cronologia da história portuguesa desde as Invasões Francesas até aos nossos dias. Também fiz algumas notas explicativas sobre a cultura portuguesa. Por exemplo, há uma nota que explica o que são as andorinhas do Bordalo Pinheiro ou quem foi Fernando Pessoa.
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Entretanto a portuguesa está esgotada, há perspetivas de reedição?
Esgotar edições é bom. A editora é que decidirá se vai haver ou não reedição…
Em 2017 publicaste também o livro “Da Gaveta”. O que distingue este livro dos teus outros livros?
O “Da Gaveta” é um livro semi autobiográfico. É diferente pois as personagens não têm nomes, os locais da ação não têm nomes e só há três capítulos cujos títulos são pronomes pessoais. É uma história de auto descoberta, de viagens insólitas e de familiarização com a nossa finitude no infinito universal. Gosto de dizer que o livro começa com a frase “A Mãe vivia numa gaveta”. A partir daí imaginem o que possa suceder. J
Em 2018 regressas aos romances de época/histórico, com “O Homem Manso”. É um género do qual te dá prazer escrever?
Gosto muito de História e gosto muito de preservar a memória histórica. Com “O Homem Manso” peguei numa figura real, dei-lhe contornos fictícios e escrevi um pouco sobre Alenquer, Portugal e o meio do século XX. Deu para escrever sobre pormenores históricos esquecidos ou mal conhecidos como a Guerra do Rife em Marrocos ou os portugueses em campos de concentração na II Guerra Mundial. Foi também uma maneira de homenagear dois valentes alenquerenses: D. Rui de Siqueira de São Martinho e o meu Pai.
Como foi a tua experiência com a publicação dos teus livros?
Foi a experiência de publicar num mercado pequeno como o português, com grande saturação de publicação para um público leitor que não é muito grande. Creio que a minha experiência não é diferente de nenhum outro autor.
Publicar numa chancela de um grande grupo editorial foi uma vantagem, ou nem por isso?
Estou muito grata à Porto Editora pela oportunidade que me deu e por ter tido um projeto editorial para autores desconhecidos. Será sempre com agrado que direi que os meus primeiros livros foram publicados pelo Grupo Porto Editora.
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Quais as maiores diferenças entre o processo de publicação entre os teus livros em português e o inglês?
Não achei grandes diferenças. No livro em inglês houve a facilidade de se trabalhar com designers para desenharem uma capa original e os mapas, o que resultou num produto muito apelativo graficamente.
Depois de publicar 4 livros, o que gostava que te tivessem dito no início de tudo?
Que o mercado é bem mais pequeno do que eu pensava…
Se pudesses viver um dia na pele de uma das suas personagens, qual escolhias e porquê?
Ui, que pergunta difícil! Talvez gostasse de ser a Máxima de “Eu, do Nada” que via tudo sem ver e que tinha aptidões especiais para ultrapassar dimensões. Quem sabe se ela não vai ter o seu próprio livro a contar a sua história?
É uma pergunta difícil, mas qual é a tua obra favorita e qual foi a mais excitante de escrever?
Dos livros que escrevi? Muito, muito difícil responder. A mais dura de escrever foi “Eu, do Nada” pela carga psicológica e a mais divertida “O Homem Manso”. “Da Gaveta” foi a que me desafiou mais a ultrapassar limites e convenções. No resto, eu não tenho obra. Só têm obra os escritores que vivem para sempre…
Quais são os autores que admiras e são para ti uma inspiração?
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Tantos… Como cliché do costume Eça de Queirós (ou nem tivesse eu feito doutoramento na sua obra jornalística, igual em qualidade à sua obra literária), Camões, Pessoa. Fora dos clichés gosto muito de Zora Neale Hurston, William Boyd, David Attenborough pela literariedade narrativa que empresta aos relatos sobre o mundo natural, Paul Theroux, Rider Haggard, Bill Bryson, Amélie Nothomb, Juliet Marilier, Colleen McCullough e tantos, tantos mais…
Por fim, o que nos podes contar sobre os teus projetos futuros?
Ando a trabalhar na tradução de outro dos meus livros e vamos ver se não vem aí mais qualquer coisa original. Gostava de continuar nos romances e, quem sabe, aventurar-me nos livros de viagens e de… receitas.
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